O setor da construção civil se mantém em crescimento em 2025, segundo as projeções de entidades setoriais. A Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) prevê um avanço de 2,3% no PIB da atividade, enquanto o SindusCon-SP e o Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV-Ibre) estimam alta de 3%. As apostas são positivas – principalmente no segmento popular, incentivados por programas como Minha Casa Minha Vida ou investimentos de construtoras que tinham atuação regional, para outras áreas do país – , mesmo diante de desafios enfrentados pelo mercado, como a alta sucessiva da taxa de juros e dos custos do setor, fatores marcantes que influenciaram o desempenho das empresas no ano passado.
Para Fabio Cassab, sócio da EXEC, consultoria especializada na contratação e desenvolvimento de altos executivos e conselheiros, a construção civil hoje convive com duas grandes realidades: uma mudança de mentalidade pós-pandemia, com os profissionais indo em busca de possibilidades de um trabalho mais equilibrado entre remoto e presencial, e uma significativa carência de lideranças preparadas e qualificadas não somente sob a ótica técnica, mas também liderança, gestão estratégica, orientação ao negócio…
Outro gargalo apontado por Cassab diz respeito à capacitação ou inovação técnica, que tem dificuldade em acompanhar lado a lado o avanço das tecnologias como visto em outros segmentos. “A construção civil no Brasil ainda é um setor que segue processos e modelos de trabalho que se repetem há anos, da mesma forma.”
“A Sondagem da Construção”, pesquisa realizada pelo FGV-Ibre, apontou que 71,2% dos empregadores do setor da construção civil declararam ter tido dificuldades em contratar trabalhadores qualificados entre junho de 2023 e junho de 2024.
Altos executivos
Como já citado, o sócio da EXEC ressalta que muitas vezes a formação profissional pautada predominantemente em experiências práticas, apesar de fundamentais, podem limitar o desenvolvimento de outras competências importantes para essas posições, como liderança, atuação estratégica, visão de negócios, gestão de perdas e lucros, entre outras. “Existem muitos profissionais altamente qualificados e competentes para tocar a operação, ou seja, desempenham um excelente papel dentro do canteiro de obra. Mas, a atuação fora dali fica muitas vezes comprometida ou limitada”, enfatiza.
Cassab destaca outro desafio importante nesse sentido: a remuneração, principalmente em um universo composto por um grande volume de pequenas e médias empresas pulverizadas pelo país, que disputam espaço com as grandes construtoras. “Enquanto grandes companhias podem oferecer um horizonte seguro, com critérios claros, programas estruturados de desenvolvimento e objetivos de remuneração, as PMEs têm uma limitação maior e, muitas vezes, a falta de visão de médio e longo prazo acaba predominando para definir tanto ganhos mensais, de curto prazo, quanto em programas variáveis e de longo prazo desses executivos”.
Esse modelo atrativo pode apresentar armadilhas na hora de tomar a decisão de mudar de empresa em troca de um pacote financeiro agressivo e uma promessa de curto prazo. No entanto, após uma ou duas obras, essa realidade não se sustenta e ele é obrigado a buscar uma nova oportunidade, avalia o sócio da EXEC. “Isso, muitas vezes, estimula uma ‘briga’ no mercado por talentos que não criam vínculos longos, geram relações fragilizadas e remunerações sem contrapartida de entrega”.
Além disso, muitas contratações desses executivos são feitas pautadas no relacionamento pessoal. “Com pouco critério objetivo, fundamentado e estruturado”, ressalta Cassab. “É algo culturalmente forte nesse segmento. Movimentações muito pautadas em relacionamento, sem muita fundamentação, critérios técnicos de seleção, aderência cultural, etc.” Mais um fator que contribui para constantes movimentações e pouca estabilidade.
Fábio, que há vários anos atua no recrutamento de altos executivos para o setor da construção civil, aponta algumas oportunidades que as empresas do mercado podem abraçar para tentar conter esse problema. “O setor da construção civil vive um momento de aquecimento de sua atividade e necessidade de profissionalização e inovação, mas, ao mesmo tempo, segue carente de mão de obra. Nesse universo, há oportunidades que essas organizações podem aproveitar para reduzir esse gap, como apostar em um job rotation constante, investir em planos de qualificação em gestão e liderança, fazer maior controle sobre as remunerações e retenções, além de adotar planos estruturados de desempenho e performance. Em paralelo, investir forte em programas de formação técnica acadêmica, além de projetos de estagiários e trainees, com olhar dedicado ao futuro. Se colocadas essas estratégias em prática, a chance de sucesso é grande”.
Ponto de atenção para o futuro
Para os próximos cinco anos, Cassab acredita que o problema de falta de mão de obra no setor da construção civil pode ser devastador para o segmento, por conta da falta de interesse por parte dos jovens que vão para a universidade. “Como se trata de um trabalho 100% em campo, com pouquíssima possibilidade de atuação remota, muitos jovens não têm mais visto a engenharia civil como uma profissão atrativa. Eles preferem carreiras com menos esforço físico e melhores condições de trabalho. E quem se forma na área acaba migrando para setores com salários mais atrativos ou que ofereçam maior estabilidade”, conclui.